Alguns alimentos podem causar sintomas desagradáveis quando consumidos por algumas pessoas, indicando alergia, intolerância ou sensibilidade alimentar. Muito embora alimentos e os sintomas que desencadeiam as reações do organismo sejam parecidos, cada uma dessas condições – alergia, intolerância ou sensibilidade – é responsável por um problema diferente, com tratamentos específicos.
Alergia alimentar
A nutróloga pediátrica da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), Karla Cristina Vilanova, explica que alergia alimentar é um termo utilizado para descrever as reações adversas a determinados alimentos pelo sistema imunológico, que os identifica como corpos estranhos, fabrica anticorpos para combatê-los.
Essas reações acontecem por sensibilidade à alérgenos alimentares, que são alimentos mais comuns de causar alergia, como cereais que contêm glúten, leite, soja, peixes, crustáceos, ovos, castanhas, nozes e amendoins.
O cardiologista e nutrólogo Lair Ribeiro, autor de mais de 40 livros, exemplifica o fenômeno imunológico: “alergia alimentar é o que acontece quando você come um camarão e fica com coceira. Você tem que ir a uma emergência para tomar corticoide, anti-histamínico, adrenalina, se não pode ocorrer edema de glote – uma reação alérgica grave que compromete a respiração e pode matar”, explica.
Segundo Karla, de fato, as reações ocorrem minutos após a exposição ao alimento envolvido, e as manifestações mais comuns são:
1 – Reações cutâneas como:
- urticárias, em geral, intensamente pruriginosas;
- inchaço da pele em vários lugares do corpo, como olhos e boca.
2 – Reações gastrintestinais, com edema e prurido de lábios, língua ou palato, vômitos e diarreia.
3 – Reações respiratórias, podendo ocorrer falta de ar que pode vir associada a um chiado, uma leve dor no peito, tosse, tontura, fraqueza e coriza.
4 – Reações sistêmicas como:
- Anafilaxia – uma reação alérgica aguda que acontece imediatamente após a exposição a um alérgeno ou após algumas horas da exposição. Na maioria das vezes, a anafilaxia é grave e pode ser fatal;
- Choque anafilático – uma forma grave de reação, desencadeada por diversos agentes como drogas, alimentos e contrastes radiológicos.
De acordo com a médica, o teste de provocação oral (TPO) é o método mais confiável no diagnóstico da alergia alimentar. “Consiste na oferta progressiva do alimento suspeito e/ou placebo, em intervalos regulares, sob supervisão médica para monitoramento de possíveis reações clínicas, após um período sem consumir o alimento que causa alergia para resolução dos sintomas clínicos”, explica Karla.
A base do tratamento da alergia alimentar é essencialmente nutricional, ou seja, com a exclusão total dos alérgenos alimentares responsáveis pela reação alérgica com substituição apropriada. Por determinado período, o paciente não deve entrar em contato de forma alguma com o alimento, para indução de tolerância.
“O objetivo global do tratamento nutricional é evitar o desencadeamento dos sintomas, a progressão da doença e a piora das manifestações alérgicas”, pontua. A nutróloga destaca que o tratamento da alergia alimentar é fundamental para a criança, porque a infância tem suas particularidades em relação às fases de crescimento e desenvolvimento, e as doenças – agudas e crônicas – podem alterá-las.
Leia também: Beber vinho todos os dias é um hábito saudável?
Intolerância alimentar
A intolerância alimentar é o nome que se dá à incapacidade parcial ou completa do organismo de digerir ou absorver algum nutriente. Karla explica que ela ocorre quando o corpo não produz, ou produz em quantidade insuficiente, alguma enzima digestiva, responsável pela digestão e pelo processamento dos alimentos.
Sendo assim, quando a pessoa ingere uma quantidade além da capacidade que o organismo tem de digerir, ela vai apresentar sintomas como flatulência, dor na barriga, náusea e diarreia. De acordo com a médica, o tratamento consiste na redução, e não exclusão total, do alimento que contenha a enzima.
O principal nutriente que gera a intolerância alimentar é o açúcar do leite, conhecido como lactose, mas também pode haver intolerância à frutose e outros carboidratos. No caso da intolerância à lactose, o tratamento disponível é a eliminação da lactose da alimentação, para verificar se o paciente apresenta uma melhora clínica.
Lair Ribeiro reforça que a intolerância alimentar não é imunológica e sim enzimática. “Na intolerância, eu não tenho a enzima lactase para transformar lactose em glicose e galactose. Vejamos: 90% do leite é água. Do que sobra, a maior parte é açúcar. Esse açúcar do leite chama-se lactose, substância que precisa ser quebrada em glicose e galactose. Quem faz isso é uma enzima chamada lactase. As crianças têm lactase, mas, a partir dos nove anos, a produção de lactase vai a zero praticamente. Há pessoas com mais intolerância que outras”, informa.
Por que a intolerância alimentar ao leite de vaca acontece?
Erika Simone Carvalho, presidente do Conselho Regional de Nutricionistas de Minas Gerais (CRN-9), explica que o leite de vaca é constituído por gorduras, lactose – que é um tipo de carboidrato –, e proteínas, além de vitaminas e minerais.
De acordo com a nutricionista, a intolerância à lactose ocorre em algumas pessoas devido à ausência ou ineficiência da enzima lactase, que é responsável pela digestão da lactose no intestino. Quando isso ocorre, a lactose não é absorvida pelo organismo e acaba gerando desconforto como diarreia e dores abdominais. Situações como essas levam à recomendação da substituição por leite de vaca sem lactose ou por leite de soja fortificado com minerais e vitaminas.
Por outro lado, o problema pode estar no componente proteico. Segundo Erika, a proteína do leite de vaca pode desencadear processos alérgicos, um problema comum em bebês.
Os sinais e sintomas podem se manifestar de diversas formas:
- Na pele, por meio de dermatites;
- No sistema gastrointestinal, com diarreia, vômitos, cólicas abdominais e distensão abdominal;
- Respiratório, com tosse, prurido nasal, espirros e rouquidão;
- De forma mais grave, atingindo o sistema cardiovascular.
O tratamento, de acordo com Erika, está baseado na exclusão do leite de vaca da dieta ou substituí-lo por fórmulas lácteas modificadas. Em qualquer uma das situações que envolvam desajustes com o uso do leite de vaca, o nutricionista poderá contribuir no tratamento, avaliando e promovendo adequações na alimentação de forma a promover o desenvolvimento adequado das crianças e o controle dos sintomas.
Veja também: Soja faz bem ou faz mal? Conheça os prós e contras
Sensibilidade alimentar
Segundo Karla, a sensibilidade alimentar é uma reação anormal à ingestão de alimentos, ou seja, uma resposta exagerada do sistema imunológico, mas que surge de maneira mais lenta, em até três dias após o contato com o alimento.
Geralmente, essa sensibilidade vem com manifestações gastrintestinais, como vômito, diarreia e inchaço na barriga, mas também pode apresentar urticárias, inchaço na pele e cefaleia, que é o termo médico utilizado para o que conhecemos como dor de cabeça. “A sensibilidade alimentar não apresenta a mesma intensidade da alergia, mas necessita de acompanhamento médico adequado”, afirma a nutróloga.
Para Lair Ribeiro, a hipersensibilidade alimentar, também imunológica, tem muito a ver com o cérebro. “A hipersensibilidade alimentar acontece, por exemplo, quando se como glúten no sábado à noite e a enxaqueca aparece apenas na quarta-feira de manhã”. Note que é um processo mais demorado, com uma ação prolongada. Por isso, você não costuma associar a dor de cabeça que teve na quarta-feira de manhã com a macarronada que comeu no sábado à noite.